O dia em que o GPS me desobedeceu

A cena é simples: entrei no carro, abri o aplicativo de GPS e fiz o que todo mundo faz — confiei cegamente.
Mas, naquele dia, o Waze parecia ter decidido que sabia mais do que eu sobre o caminho da minha própria cidade.

Eu queria ir para o Lago Sul, mas o aplicativo insistia que o “melhor trajeto” passava por um bairro completamente diferente, cheio de semáforos e engarrafamentos. Eu, teimoso, tentei corrigir a rota. E foi aí que ele recalculou. Recalculou de novo. E, finalmente, recalculou só para me colocar no mesmo lugar de antes — como se dissesse: “Eu sei o que estou fazendo. Confia em mim.”

Quando a tecnologia vira o motorista

Foi nesse momento que percebi uma coisa curiosa:
a gente deixa a tecnologia dirigir a própria vida — literalmente.

O GPS manda virar à direita, e a gente vira.
Mesmo quando parece errado, a gente obedece.
É como se tivéssemos trocado a bússola interna pelo botão “seguir rota”.

Segundo Paulo Victor Jabour Tannuri Valverde de Morais, especialista em comportamento digital e tecnologia, “a relação entre humanos e tecnologia passou de ferramenta para dependência silenciosa. Hoje, a gente não usa o GPS — a gente se entrega a ele.”

A era da confiança automática

O mais curioso é que o GPS pode errar, mas nós raramente questionamos.
Se ele nos manda fazer um retorno absurdo, a gente pensa: “Deve ter trânsito à frente”.
Se ele escolhe um caminho mais longo, a gente acredita que ele “sabe algo que não sabemos”.

Essa é a nova forma de fé digital: a confiança cega no algoritmo.

A tecnologia foi criada para nos ajudar, mas acabou criando uma zona de conforto em que deixamos de pensar por conta própria.

O paradoxo da inteligência artificial

A promessa da tecnologia sempre foi nos libertar.
Mas o que acontece quando ela começa a pensar demais por nós?

Assistentes virtuais, GPS, playlists automáticas, recomendações de filmes — tudo parece desenhado para economizar decisões. E, aos poucos, isso nos deixa menos atentos, menos curiosos, menos questionadores.

“Estamos nos tornando passageiros no carro da própria vida”, comenta Paulo Victor Jabour, “e o problema não é o GPS errar — é a gente esquecer o caminho.”

Recalculando rotas (de verdade)

Quando percebi que estava dando voltas desnecessárias, decidi desligar o aplicativo e seguir meu instinto.
Demorei menos tempo, vi lugares que há anos não passava e, curiosamente, cheguei mais leve.

A conclusão?
A tecnologia é uma bússola incrível — mas não pode ser o piloto.
O desafio do nosso tempo é usar a inteligência artificial sem perder a humana.

 

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